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O dia estava sombrio e frio, sensação partilhada por mim, já que sentia no corpo e na alma reflexos desse estado meteorológico. Eram aqueles períodos de entre safra, como uma leguminosa sem raiz e sem vontade de crescer. Na minha trajetória outros momentos iguais foram comuns, mas nada que não tivesse desaparecido a partir de alguns raios de sol. Sempre parece que o calor do astro vem derreter dissabores, agasalhar desilusões, aquecer o entusiasmo.
Andava naquele dia pela orla da praia e pensava que mais uma etapa seria superada e que aquele inverno não seria eterno. Continuei o percurso e o movimento físico foi ficando automático. Os pensamentos tomaram conta da paisagem e o espírito voou para novos horizontes.
Quando me dei conta, estava longe de casa, mas com o raciocínio desfeito. Aquele mesmo ar gélido fez bem e limpou as impurezas orgânicas. A respiração veio fácil e desobstruída. Estava melhor e pronta para pegar o caminho de volta.
Ao cruzar uma calçada e olhando em linha reta, um clarão interrompeu minha direção. Pisquei para entender melhor, caí na real e percebi que se tratava de uma pessoa que me fitava intensamente. Que poder tinha aquele olhar de mexer comigo! Vi que era um homem, sem detalhes, só rosto, ou melhor, olhos que diziam coisas.
Continuamos. Cada um para seu campo de ação. A distância foi aumentando e logo seria somente uma sombra apagada. Voltei a cabeça para trás e não vi mais nada. E fui sentindo ainda em mim a força daquela expressão.
Meu dia tinha mudado e eu estava aquecida, embora o céu anunciasse chuva lá adiante. Cheguei em casa, aprimorei meu banho, vesti uma roupa que caía bem, usei meu melhor perfume e resolvi que passaria o resto do dia fora. Um cartaz no cinema chamou minha atenção e no escuro da sala penetrei na história. Cenas e músicas para deixar qualquer um de bom astral.
Na saída, parecia que era uma nova mulher e que a vida sorria para mim. Não cabia em mim de tanta confiança e paixão e sentindo que a juventude era eterna. Vontade de amar, de transar, de dançar, de viver intensamente.
O verão demoraria por vir, mas a primavera dava seus primeiros sinais com as sementes já sendo adubadas. Esse ciclo vital me revelava que estava para chegar um novo amor, e com ele toda uma florada. Era só esperar um novo clarão acontecer.
Colaboração: Eunice Tomé
Jornalista, Mestre em Comunicação e Escritora
autora do livro "Pequenos Contos de Viagem"
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