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Garoto de Programa

 

Nascido homem bonito. De corpo atlético, cor morena, altura de estátua. Rosto másculo. Nada foi esquecido naquele ser no momento da concepção. Desde pequeno encantava a todos. As meninas se caíam por ele e estava sempre rodeado das mais salientes. Os meninos, por seu lado, com uma pitada de inveja, ficavam sempre a escanteio, quando o assunto era disputa de preferência.

 

Com toda essa paparicagem, desde cedo descuidou de outros afazeres que exigiam muito esforço intelectual. Os esportes apresentavam as melhores opções, assim poderia aprimorar melhor sua performance. A musculação completava o vigor e salientava as partes do corpo que já eram bem definidas: coxas, braços e abdômen.

 

O tempo foi chegando e esse homem/Apolo decidiu enveredar por uma atividade que ao mesmo tempo lhe dava prazer e fazia-o exercitar aquilo que tinha de melhor. Virou garoto de programa. Dizia ele que sem querer. O dinheiro era pouco, emprego de boa remuneração escasso e ele precisava sustentar suas vaidades.

 

Começou por sair com menininhas, amigas, namoradas, até que a relação estava ficando impessoal, a ponto de os encontros serem marcados sem conhecimento prévio. Era alguém que dava seu celular, seu e.mail e suas referências: moreno, gostoso, bem dotado e carinhoso. A fama corria e mulheres de todas as idades procuravam-no para uma noite ou apenas algumas horas. Cobrava por hora e seu cachê estava valioso, digno de boa mercadoria.

 

Criou um site, publicando algumas fotos e dicas de como fazer sexo sem risco e com garantias de discrição. Numa dessas pesquisas na Internet, uma mulher casada, de perto de 40 anos, teve vontade de se comunicar com ele. Feitas as tratativas, o encontro foi marcado no apartamento dela, em um sábado. O marido tinha viajado a negócios e ela preferia que fosse no seu território e, assim, não se expondo às vistas de terceiros.

 

Tudo acertado, chegou o grande dia. Ela não era de se jogar fora, mas estava bastante carente de amor, pois o seu marido era de grandes compromissos e entornava na bebida. E aí, ficava a ver navios e até já estava frequentando reuniões terapêuticas para resolver seus problemas de desejos não saciados. Achou melhor tentar na prática, do que no divã do psiquiatra, mesmo porque esse profissional não inspirava o seu lado sensual.

 

Foi uma aparição descontrolada, ao perceber a qualidade de sua aquisição. Não esperava tanto e começaram por tomar uma bebida. Ele não costumava beber, para não perder o rumo do trabalho. Mas apenas para quebrar o gelo dos primeiros instantes. Música e perfume no ar, um convite para uma dança e as roupas foram caindo uma a uma. Banho de espumas na hidromassagem e todo o deslumbramento de uma grande aventura.

 

Ambos não se preocuparam com o tempo. A boa conta bancária não era problema. Ele deixou o celular desligado para não ser incomodado com outros encontros e ofereceu a ela toda a experiência da arte do sexo, entremeando com banhos, cochilos, sucos e carinhos delirantes. Ao final, ela tinha a certeza que queria aquele homem para sempre, debaixo do seu nariz e com exclusividade.


As oportunidades se repetiram, ela programou viagem para eles, onde pudessem gozar as delícias de praias em lugares desertos e a paixão era tamanha que a ousadia acompanhou esse delírio, a ponto dela fazer uma festa na sua casa com amigos da família e convidá-lo. Foi apresentado como colega de uma prima. Essa concordara em chegar com ele e fazer esse papel.

 

Na hora das apresentações, todas as mulheres estavam encantadas e ela sentia um orgulho disfarçado em ser dona do objeto desejado. O marido nada desconfiou e, entre uma bebida e outra, se debandou para os lados do rapaz, puxando conversa fiada.
Após o jantar, já no cafezinho, o marido coloca um bilhete no bolso do garoto de programa. Ao perceber, ele estremeceu, mas não podia nada falar, deixando para ver o conteúdo depois que saísse daquele ambiente.

 

Deixou a prima da amante em casa e, ainda no carro, colocou a mão no bolso e pode ver a mensagem: "fiquei muito impressionado com você e gostaria de manter um contato reservado". O susto foi grande e ele pensou que novas experiências avizinhavam-se.


Colaboração: Eunice Tomé
Jornalista, Mestre em Comunicação e Escritora
autora do livro "Pequenos Contos de Viagem"

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