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Edmundo e Nelcy começaram a relação por acaso. Entre uma dança e outra de uma festa de confraternização, sentiram que o calor do corpo tinha algo mais a dizer, apesar de no trabalho nunca terem despertado para essa reação química. Primeiro, que ele era casado e nunca pensou nele com essa possibilidade de amante. Mas aconteceu.
Domingo, dia seguinte à festa, ela recebeu um telefonema, logo pela manhã. Era ele para dizer que quase não dormira pensando em vê-la de novo, mas a sós. Foi um tremor e o medo de que isso poderia complicar no dia-a-dia e nas relações de trabalho. Mas não teve como evitar, porque também estava muito a fim.
Tinham que se encontrar em lugar pouco conhecido e resolveram ir a São Paulo naquele dia. Ela foi de carro e o pegou no caminho. Jantaram e foram a um motel, para extravasarem todo o desejo que se intensificava, desde o toque de mão, do roçar do braço e da profundidade do olhar. Foi a realização da plenitude, nunca antes ter acontecido com os dois.
Com esse sentimento, não conseguiram ficar mais separados. Após sucessivos encontros fortuitos, programaram uma viagem pela Rio-Santos, que os levaria a Parati.
Nelcy não conhecia essa cidade histórica e ficou enamorada de imediato ao chegar, ainda mais que estava igualmente apaixonada por seu companheiro. Ele nunca dera demonstrações de ser o que era e a surpreendia a cada novo contato. Era o homem mais maravilhoso que conhecera até então, um amante de fôlego e de muita experiência.
Os dois dias passados em Parati foram vividos loucamente e, quando não estavam rolando na vasta cama do hotel e trocando carícias, saíam a passear pelas ruas de pedras largas, comprando artesanatos e ouvindo o violão de músicos desconhecidos. À noite, o jantar em restaurante que fazia uma lula recheada ao molho de coco, regada a vinho branco. Dos deuses e com requinte. As luzes do lugar saíam em pontos indiretos, transformando o ambiente em mais íntimo e próprio aos amantes.
A cidade, considerada Patrimônio Cultural, tem as igrejas quase mais antigas do Brasil e todas com nomes de santas. Em investigação, vieram a saber que a influência feminina era grande, desde os tempos das rotas do comércio de ouro feito por mar, onde os homens saíam para esse trabalho, ficando as mulheres cuidando da cidade.
A felicidade era tanta, que Nelcy sentiu-se a própria matriarca e dona do seu pedaço, naquele ponto entre a Mata Atlântica e o mar, fazendo cumprir os destinos dos antepassados. Ela estava no auge da maturidade e tinha plena convicção de que nenhuma outra mulher no planeta tinha atingido orgasmos da sua natureza, em intensidade, quantidade e beleza. Aquele homem parecia que tinha saído das profundezas do desconhecido, sendo o símbolo do macho por excelência, que não media esforços para a parceira chegar ao seu máximo.
Para selar a visita a Parati, compraram alguns enfeites de casa, que ele dizia que um dia teriam em conjunto. A vontade era não saírem daquela cidade, com medo de desfazerem o encanto. Na volta, pela linda estrada da Rio-Santos e toda a sua paisagem marinha, mais uma vez desceram do carro e foram à Praia de Guaecá, onde também selaram beijos e ao cair da tarde fizeram amor em plena areia.
Outras viagens fizeram para fugir dos olhos alheios e moralistas e viverem a cálida paixão, sempre na rota do mar, incluindo Ilha Bela e Angra dos Reis. Os encontros duraram cerca de um ano e sempre com muita identificação. Até que começou a ficar insustentável, como toda relação entre amantes.
Os desgastes foram se intensificando e chegaram ao ponto da ruptura. Nelcy pediu uma transferência para outro departamento na empresa e passaram a ficar longe dos olhos e dos corpos. O coração, no entanto, continuava a palpitar, pois amor assim não acontece todo dia.
Na primeira oportunidade, Nelcy foi a Parati sozinha. Relembrava cada palavra, cada abraço. As paredes antigas dessa cidade pareciam ecoar em ondas repetidas. Ela precisava disso para tentar chegar mais perto do que vivera e os versos vieram fáceis:
"Das paredes antigas
Ouvia o teu nome
Que pronunciei por tantas vezes
Nos momentos de amor."
Colaboração: Eunice Tomé
Jornalista, Mestre em Comunicação e Escritora
autora do livro "Pequenos Contos de Viagem"
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